quarta-feira, 15 de setembro de 2010

O sintoma e a caligrafia.


A carta


Eu quero fechar os olhos e te guardar em mim pelos instantes últimos que eu for te conceber... mas, o pior é que as pálpebras se cerram tão rapidamente que no mesmo curso chega um ardor e me arrebata - com já tanta saudade que os olhos desaguam;
e tu não se esvai, te transforma em leito.

O rascunho

Eu quero fechar os olhos e lembrar apenas o que vi, pouco antes de me fechar na sombra das pálpebras, na minha escuridão - e é por isso que te chamei até aqui.

Pensamento

Entenda que o que eu posso fazer por ti é a tua existência mais nobre dentro de mim, e tu és assim, a preciosidade que reluz de todo lume a primeiro raio solar pela cortina do meu quarto; és o começo e fim da aurora do meu dia; com a entrega que só as flores, o vento, o meu perfume que teu cheiro combinado fez mais especial - é sentido natural para que eu durma; me alimente; escreva; expurgando minha alma lhe rabiscando como o preciso do começo de um fim, o tom de cada dia como a que renasço e retrocedo, à espera como à volta e ao que segue, nossos dias muito mais que um calendário.
E nenhuma súplica reflete ou mede, ou que apenas um inspiro puro de vida lá fora, infla os pulmões e vive o que inspira, como se dissesse teu nome lento e tão naturalmente que nenhuma palavra seja precisa de verdades provadas - já que a boca menciona na carne seu próprio alimento.
Aprecias a assinatura calada, que explana toda a verdade com o vento: vem e transforma sem pedir, porque é forte e justa, funde o puro em seu próprio ponto final - vida concentrada, afinal.


"(...) Tu, manejando o sintoma de minha caligrafia
E encontrando na areia do caderno
As letras extraviadas que buscavam tua boca
(...)"

(Pablo Neruda)