domingo, 26 de julho de 2009

Imag/in/ação

Ela chegou ao portão, ouvindo seus próprios passos durante o percurso, ouvindo atentamente a superfície do chão. Habituou os olhos a familiaridade da casa, e pelas horas, percorreu os hábitos - fácil estranhou o silêncio de tudo tão dormido, e a luz do quarto acesa, mas sem alarde - abriu o portão e adentrou. Destrancou a fechadura, tudo calmo. Andou até o corredor, luz do quarto penetrando o chão nesse limiar mudo, ouviu um som vivo demais pra ser coisa qualquer. Franziu a sobrancelha e sabendo que pensar não resolveria, caminhou até seu próprio mistério; chegou mais rápida até a porta, e viu. pôs a mão esquerda no batente da porta, segurou a alça da bolsa, com ternura olhou e titubeou, não acreditou, e os olhos percorreram: ele estava lá, sentado na cama.
Os olhos dela inundados da água da garoa e do transbordamento de si sorriram nos lábios dele, largos e lindos - transparentes na saliva, saciaram-se. Nenhuma palavra alimenta a alma em tanta sofisticação quanto o consentimento. E assim não foi necessária.

As mãos se encontraram, no relevo do corpo o saber eterno, o mistério que só se descobre na entrega e no mais profundo abraço. e de suspiro o alívio, e o inacreditável na fome e na busca.
As mãos atingiram o peito, mímicas de poros que se conheciam bem demais. Fechos abriram-se sem pudor, zíper deslizando, e os botões desabrochavam as flores nascendo, rosas e fundas, tão eternas na primavera que chegava cedo; mas eles já esperavam.
Afinal,
nenhum relógio passa o sentimento, tão menos o perdão pra ser vivo, pra acometer-se da entrega latente demais pra deixar encolher no frio o brio da realidade...

Adora-se o sonho e sua névoa em duas partes, dois corpos.

quinta-feira, 16 de julho de 2009

(Des)acessos

Ela despertou. Uma corrente súbita e imensa percorreu-lhe o corpo todo em um segundo. Os olhos quiseram abrigar-se para enxergar, mas não podiam ver. Então não. Segurou as pálpebras. Respirou o mais fundo que pôde. Sabia que era a vida entranhando-lhe os ossos. Os poros confirmavam arrepiando-se querendo entrar mais fundo ainda na pele, arrepiando-a de um cansaço desde o começo. Estiram-se os nervos de todo o corpo e doem na ponta dos dedos - justamente neles, parece que pelos mesmos, sempre haverá o que dizer. Deslizou o corpo do dia pela cama, tão confortável no momento antes de dormir estava, que podia sentir o calor apenas do seu corpo encobrindo a pele do frio, trazendo lento para o cansaço o alento, no mormaço que pouco a pouco lhe esvai de forças e recorre ao sono. Viveu nitidamente aquele instante, tentando alongá-lo com pensamentos distantes, provocando até o incômodo que naquele instante de luz apagada e corpo brando, aonde feiche para entrar nela não haveria - o embrutecimento irônico da sua fragilidade mais intensa.
Foi esta a conexão que conseguiu do tempo curto passado antes de despertar, lembrar. E surgiu como esperança qualquer para viver um novo dia e subtrair-se no cansaço e na mágoa, para num instante antes de dormir, devolver-lhe um repouso que há tempo (meu deus, seis meses!) seus débeis nervos não permitiam-se tão fáceis.

O exercício das pequenas coisas enrustidos nas muitas maiores vontades que aquele peito suspirando desgaste falava, era sem o troco da voz; outro vocábulo ecoava no teto, caindo da abóbada celeste; gotas de chuva minimizando-lhe a disposição de devolver-se a mais um dia longo e difícil, mas ainda mais curto é o período pra si, se negligenciar seus próprios contos; de honestidade e desapego ela sofre pelo mundo que sopra vazio entre os dedos, e compreende, de um conteúdo excecrado de si mesma, nesses (des)acessos.

Deixou o coração palpitar forte outra vez. Fez-se desvencilhar do instante de perda instantânea da capacidade de dormir tão mais que se pede o corpo, (querer então) no inconsciente flutuar e conhecer-se do sonho tão-somente e deixar o tempo vivendo-se entre o mundo e as estações inexplicáveis do mistério da vida - e assim que ela voltar, anos mais tarde, quem sabe (meio ano... voou!), e ver como estão as coisas, e olhar para si própria e conectar-se à realidade além de um vão de espera e migalhas da benevolência de uma divindade (que não existe) qualquer.

Quem sabe, se pudesse... essa manhã não seria no seu cinza e no seus traços vagos, a esperança do sol em seu circuito laranja e vivaz, não haveriam lembranças e suas vestes, e bilhetes não-escritos entranhados na língua que saliva solitária e esbarra clamores nas paredes - que já revelam no mofo e no cheiro, o hálito e o teor da fala. O puro descontentamento a dar-lhe sinais de emergência que no seu estado, já não encaixa-se em excessos e erros consecutivos, é uma densa espera amadurecendo nos seus olhos - verdes como a esperança de um escafandro que há de desvencilhar-se da própria crosta, e na sua natureza revelar-se livre pra chegar ao próprio lugar.
Pudesse ser hoje, tão mais simples. Mas o dia persite em nascer nos seus signos relevantes de conta própria para revelar os mistérios que nunca foram ditos além de critérios de espíritos inquietos.
Por isso um tom a mais no tamborilar de seus dedos, na percepção da pele demasiada sensível - o troco, do que dizer enrolando os vínculos respectivos que conduzem a vida sem entender, mas jorrando nas explicações as sinestesias, do que só pode transformar o ser que transfigura-se na sua condição eternamente fértil, de viver.

09:21h

segunda-feira, 13 de julho de 2009

O pra sempre que eles não aguentam, aguardam.

A pele alargou-se ao ponto de estourar quando ele foi para o outro lado e ela ainda viu-se conectada à ele. Assim ele prosseguiu esticando a pele dela, e ela se esfolando viva, na carne exposta do desejo mais profundo... fazendo desenhos com a própria veia, enxergando-se de dentro como nunca antes vira.
A dor tamanha dissipou a vertente do corpo,
o coração passou a pulsar por tudo.
Não havia como discernir de si a dor pra resultar a vida,

e ele vai andando... hoje como passado não exatamente,
mas como presente negado do privilégio de não necessitar fatiar o tempo pra (com)prometer o seu sentir; ele vaga entre becos, ela pouco a pouco vai renovando a pele para também não o machucar com o fato, de que a sua sombra sempre está atrás - desde quando ele assumiu a existência na vida de mais alguém.

A segurança disso é uma verdade que ninguém vai tirar
- e quando mudar, duvidar-se-á da vitalidade do mesmo
E se agora não é a veracidade que vai tocar-lhe
a consciência além do vento nos cabelos,
ela vai cantar para chegar nos ouvidos dele...
e mesmo que prossiga
Ela sabe que como hoje,
o fato vai percorrer sua pele em mais um dia,
nos olhos que se abrem; a consciência se espalha,
e pelo fato, de novo,
as costas se curvarão como seu peso, um fardo.