quinta-feira, 16 de julho de 2009

(Des)acessos

Ela despertou. Uma corrente súbita e imensa percorreu-lhe o corpo todo em um segundo. Os olhos quiseram abrigar-se para enxergar, mas não podiam ver. Então não. Segurou as pálpebras. Respirou o mais fundo que pôde. Sabia que era a vida entranhando-lhe os ossos. Os poros confirmavam arrepiando-se querendo entrar mais fundo ainda na pele, arrepiando-a de um cansaço desde o começo. Estiram-se os nervos de todo o corpo e doem na ponta dos dedos - justamente neles, parece que pelos mesmos, sempre haverá o que dizer. Deslizou o corpo do dia pela cama, tão confortável no momento antes de dormir estava, que podia sentir o calor apenas do seu corpo encobrindo a pele do frio, trazendo lento para o cansaço o alento, no mormaço que pouco a pouco lhe esvai de forças e recorre ao sono. Viveu nitidamente aquele instante, tentando alongá-lo com pensamentos distantes, provocando até o incômodo que naquele instante de luz apagada e corpo brando, aonde feiche para entrar nela não haveria - o embrutecimento irônico da sua fragilidade mais intensa.
Foi esta a conexão que conseguiu do tempo curto passado antes de despertar, lembrar. E surgiu como esperança qualquer para viver um novo dia e subtrair-se no cansaço e na mágoa, para num instante antes de dormir, devolver-lhe um repouso que há tempo (meu deus, seis meses!) seus débeis nervos não permitiam-se tão fáceis.

O exercício das pequenas coisas enrustidos nas muitas maiores vontades que aquele peito suspirando desgaste falava, era sem o troco da voz; outro vocábulo ecoava no teto, caindo da abóbada celeste; gotas de chuva minimizando-lhe a disposição de devolver-se a mais um dia longo e difícil, mas ainda mais curto é o período pra si, se negligenciar seus próprios contos; de honestidade e desapego ela sofre pelo mundo que sopra vazio entre os dedos, e compreende, de um conteúdo excecrado de si mesma, nesses (des)acessos.

Deixou o coração palpitar forte outra vez. Fez-se desvencilhar do instante de perda instantânea da capacidade de dormir tão mais que se pede o corpo, (querer então) no inconsciente flutuar e conhecer-se do sonho tão-somente e deixar o tempo vivendo-se entre o mundo e as estações inexplicáveis do mistério da vida - e assim que ela voltar, anos mais tarde, quem sabe (meio ano... voou!), e ver como estão as coisas, e olhar para si própria e conectar-se à realidade além de um vão de espera e migalhas da benevolência de uma divindade (que não existe) qualquer.

Quem sabe, se pudesse... essa manhã não seria no seu cinza e no seus traços vagos, a esperança do sol em seu circuito laranja e vivaz, não haveriam lembranças e suas vestes, e bilhetes não-escritos entranhados na língua que saliva solitária e esbarra clamores nas paredes - que já revelam no mofo e no cheiro, o hálito e o teor da fala. O puro descontentamento a dar-lhe sinais de emergência que no seu estado, já não encaixa-se em excessos e erros consecutivos, é uma densa espera amadurecendo nos seus olhos - verdes como a esperança de um escafandro que há de desvencilhar-se da própria crosta, e na sua natureza revelar-se livre pra chegar ao próprio lugar.
Pudesse ser hoje, tão mais simples. Mas o dia persite em nascer nos seus signos relevantes de conta própria para revelar os mistérios que nunca foram ditos além de critérios de espíritos inquietos.
Por isso um tom a mais no tamborilar de seus dedos, na percepção da pele demasiada sensível - o troco, do que dizer enrolando os vínculos respectivos que conduzem a vida sem entender, mas jorrando nas explicações as sinestesias, do que só pode transformar o ser que transfigura-se na sua condição eternamente fértil, de viver.

09:21h

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